O Alcorão, a Razão e o Coração

Por Ayatullah M. Mutahhari
Tradução de Ahmed Ismail

O Alcorão utiliza duas linguagens para transmitir sua mensagem, a linguagem da lógica e a linguagem da emoção. Cada uma dessas linguagens possui seu canal de transmissão particular; a razão ou senso comum para a lógica e o coração para a emoção.(…).

A questão da autoridade da razão ocupa uma posição indubitável no Islam. Desde os primeiros tempos até hoje, dentre os sábios, com exceção de um pequeno grupo, não há dúvida sobre a autoridade da razão e comumente ela é aceita como uma das quatro fontes do fiqh (jurisprudência).

O Alcorão exorta-nos ao uso da razão

O Alcorão endossa de vários modos a autoridade da razão. Com efeito, por volta de 60 ou 70 versículos podem ser citados nos quais a reflexão é requerida. Como um exemplo citamos um dos mais severos versículos do Alcorão:

“DEFINITIVAMENTE AS PIORES CRIATURAS PARA DEUS SÃO OS SURMOS, MUDOS, QUE NÃO RACIOCINAM”. (C.8 – V.22).

Obviamente o Alcorão não se refere aos surdo-mudos fisicamente, mas sim, às pessoas que não querem ouvir a verdade ou que ouvem mas não admitem a verdade com suas línguas. Um ouvido que seja incapaz de ouvir a verdade e que esteja pronto apenas para dar ouvidos à futilidades, na visão do Alcorão, está surdo. E uma língua que é usada apenas para proferir a futilidade e coisas absurdas, é muda.

Aqueles que não raciocinam, de modo semelhante, não aproveitam nada de suas faculdades de pensamento e reflexão. O Alcorão considera tais indivíduos como indignos do nome “humano” e como sendo uma espécie de animal e refere-se a estes como “criaturas bestiais”. Em outro versículo, quando apresenta um tópico relativo ao Tawhid ou monoteísmo, o Alcorão informa-nos:

“E NENHUMA ALMA ENCONTRARÁ O IMAN (FÉ) SEM A PERMISSÃO DE DEUS”. (C.10 – V.100)

Depois de declarar isso que é obscuro e que nem todas as mentes possuem capacidade de compreender e que chega a chocar uma pessoa, o versículo continua afirmando que:

“…E ELE COLOCA A ABOMINAÇÃO SOBRE AQUELES QUE NÃO RACIOCINAM.”(C.10 – V.100).

Neste versículo o Alcorão exorta de maneira especial as pessoas a raciocinarem. Existem muitos outros versículos nos quais a autoridade da razão é de modo similar endossada. Em outras palavras, o Alcorão apresenta declarações que só podem ser aceitas se a autoridade da razão seja igualmente aceita.

Por exemplo, o Alcorão exige a prova da razão de seus opositores: “DIZE: TRAZEI VOSSA PROVA (DA RAZÃO)”. (C.2 – V.111).

Nesse ponto, a intenção é colocar a verdade de que a razão é uma autoridade e um hujjat (testemunho confiável). Similarmente, a fim de provar a unicidade de Deus o Alcorão diz: “E SE HOUVESSE NOS CÉUS E NA TERRA OUTRAS DIVINDADES ALÉM DE DEUS, JÁ SE TERIAM DESORDENADO…” (C.21 – V.22).

Neste versículo, o Alcorão colocou uma premissa condicional. Fez uma exceção da maior premissa e ignorou a menor. Com toda essa ênfase sobre AQL (razão), o Alcorão anula e evita a afirmação de algumas crenças humanas de que fé e razão estão separadas uma da outra, de que a fim de tornar-se um crente uma pessoa deveria anular sua própria razão, e fazer uso apenas de seu coração para descobrir a luz Divina.

Utilizando o Sistema de Causa e Efeito

Outra prova de que o Alcorão mantém uma distinção à razão é sua explanação de questões através da referência da relação da causa e do efeito. A relação da causa e do efeito e o princípio da causa são os fundamentos do pensamento racional e ambos são usados e considerados pelo Alcorão.

Muito embora o Alcorão nos fala em favor de Deus, O Todo Poderoso, que é o Criador da ordem de causa e efeito, e muito embora ele nos fale do ALÉM, para o qual causa e efeito é um princípio de menor relevância, ainda assim o Alcorão não deprecia a menção deste sistema mundano de causa e efeito e considera a realidade material e suas manifestações como sujeitas a ele.

O Alcorão declara:

“DEUS NÃO MUDA AS CONDIÇÕES DE UM POVO ATÉ QUE ELE MUDE SUA PRÓPRIA CONDIÇÃO” (C. 8 – V.17)

Neste ponto, o Alcorão fala-nos que é uma idéia correta que o destino pertença a DEUS, porém DEUS não impõe o destino sobre o homem quanto à totalidade de suas ações, decisões e escolhas, e não age indiferente a isso.

O destino também possui um sistema ou ordem, e DEUS não muda o destino de nenhuma sociedade sem nenhuma razão; e apenas efetua alguma mudança quando um povo muda naquilo que é relativo ao mesmo, seja sua ordem ética ou social por exemplo. Por outro lado, o Alcorão encoraja os muçulmanos a meditar sobre as condições dos povos anteriores e os eventos que adviram sobre eles, e buscar nisso uma lição.

É evidente que se tais eventos fossem impostos indiferentemente e por acaso sobre esses povos não existiria nenhum sentido em meditar sobre o destino destes povos pretéritos ou tomar alguma lição de semelhantes fatos. Por meio dessa ênfase o Alcorão tem a intenção de recordar-nos que o destino está sujeito a um regulamento de um único sistema ou ordem. De modo que, se as condições de um povo ou sociedade são as mesmas de algum povo do passado, o destino esperado deste povo ou sociedade será o mesmo que ocorreu àquele povo que o precedeu.

Em outro versículo o Alcorão afirma: “QUANTAS CIDADES DESTRUÍMOS POR SUA INIQUIDADE ENQUANTO ESTAVAM A COMETER INJUSTIÇA E OPRESSÃO E QUANTOS POÇOS E PALÁCIOS VAZIOS!”

Então, o Alcorão pergunta o porque de todos os povos das épocas posteriores não desejarem percorrer a terra, analisar e tomar lições do que aconteceu antes, em todos essas questões, há uma aceitação tácita da ordem de causa e efeito, e para admitir a relação entre causa e efeito deve-se aceitar a autoridade da razão.

A Filosofia dos Mandamentos

Outra prova da autoridade da razão de acordo com a visão alcorânica é que esta menciona a existência de uma filosofia para os seus mandamentos (ou preceitos) (ahkam). O significado disso é que os mandamentos que são dados resultam de um melhor interesse a ser encontrado.

Os fuqaha (sábios de jurisprudência) dizem que o encontro do que é melhor é uma das causas da existência dos ahkam (preceitos) (uma outra razão seria a existência das formas de corrupção). Por exemplo, o Alcorão nos diz para nos empenharmos na Oração enquanto, em outra passagem, ele também menciona sua filosofia: “A PRECE DEFINITIVAMENTE AFASTA A OBSCENIDADE E O ILÍCITO.”

O Alcorão menciona o efeito da oração em termos do ser humano elevar-se e, devido a essa elevação, torna-se averso à obscenidade, interdita os males e evita-os. De modo similar, o Alcorão menciona o jejum e, depois de ordenar seu cumprimento diz-nos:

“O JEJUM ESTÁ PRESCRITO Á VÓS COMO FOI PRESCRITO PARA OS QUE VOS ANTECEDERAM PARA QUE TEMAIS A DEUS. (C.2 – V.183).

E assim, da mesma maneira isso é dito para outros preceitos, como o Zakat, o Jihad e assim por diante; e cada qual deles é explicado em relação ao indivíduo e a sociedade, neste modo o Alcorão determina-nos os Ahkam, embora eles provenham da dimensão do além, uma causa terrena é citada para que o homem reflita sobre eles até que a essência do princípio torne-se clara para ele, ao invés de que ele pense que esses preceitos sejam inteiramente uma espécie de código de leis além do alcance da razão humana.

Combatendo os Erros da Razão

Uma outra coisa que prova a distinção que o Alcorão destina à razão, e que é mais enfática, é o esforço do Alcorão no combate aos erros da razão. A fim de explicar essa questão, devemos explicar um outro ponto introdutório.

Em muitas ocasiões, a mente e o pensamento humano incorrem em enganos. Naturalmente isto não se limita apenas à razão, pois os desejos e as emoções também causam erros. Entretanto, na faculdade da razão, muitas são as vezes em que alguém usa seu raciocínio e deduz algo sobre o qual chega a uma conclusão e mais tarde percebe que a base para a dedução estava errada. A questão que surge aqui é: devido ter usado seu raciocínio de modo errado algumas vezes, alguém deveria abdicar de sua razão, ou deveria usar seu raciocínio de modo a identificar os enganos para não cometê-los novamente? (…)

O Alcorão apresenta certas diretrizes a fim de que o homem se previna dos erros em suas deduções racionais.

A Visão Alcorânica das Fontes do Erro

Uma das causas que o Alcorão aponta para os erros e enganos é “a probabilidade ser tomada por certeza”. Se uma pessoa firma-se no princípio de que ela seguirá a certeza e não aceitará o provável no lugar da certeza, ela não cometerá erros. (obs. Naturalmente deve ser entendido que onde a certeza não pode ser adquirida, possibilidade e probabilidade devem ser levadas em consideração. Não como certeza, mas como o que elas realmente são, possibilidade e probabilidade. Tomá-las como certeza resulta em erros).

O Alcorão enfatiza sobremaneira esta questão e em uma passagem, ele chega mesmo a deixar claro que as maiores ocasiões para o erro são as que surgem ao se seguir a probabilidade. Em outra passagem, dirigindo-se ao Profeta (S.A.A.S.) o Alcorão diz:

“SE SEGUIRES A MAIORIA DOS HUMANOS DA TERRA ELES TE DESVIARÃO DA SENDA DE DEUS POIS ELES SEGUEM APENAS CONJECTURAS”. (C.6 – V. 117)

E em outro versículo:

“E NÃO SIGAIS AQUILO DE QUE NÃO TENS CONHECIMENTO”(C.17 – V.36).

Através de toda história do pensamento humano, o Alcorão foi o primeiro a ressaltar isto e proibir o homem desse tipo de erro. A segunda fonte de erro no raciocínio é o que ocorre especialmente nas relações sociais: a imitação cega. Muitas pessoas são de tal modo que tudo no que seu grupo social crê, elas também crêem. Isto é, apenas porque algo é aceito pela sociedade em que vivem ou pelas gerações anteriores elas também o aceitam.

O Alcorão nos instrui a medir cada questão com o padrão da razão e não adotar tudo o que nossos antepassados fizeram como algo indubitável e nem rejeitar seus exemplos inteiramente(…). Ao adotar ou rejeitar qualquer costume, idéia ou crença nós devemos buscar o auxílio do raciocínio, não aderir cegamente à imitação. Com estas palavras o Alcorão expõe essa orientação:

“E QUANDO É DITO A ELES : SEGUÍ O QUE ALLAH TEM REVELADO, DIZEM ELES: AO CONTRÁRIO, SEGUIREMOS AQUILO QUE QUE NOSSOS PAIS SEGUIAM” MESMO SE SEUS PAIS NÃO RACIONAVAM DE MODO ALGUM E NEM FORAM CORRETAMENTE ORIENTADOS? “(C.2 – V.170).

O Alcorão também enfatiza que a antiguidade de uma idéia ou crença não é nem prova dela ser ultrapassada e incorreta nem tampouco de que ela seja correta e válida. As coisas materiais tornam-se ultrapassadas e obsoletas, porém, as realidades da existência, não importando quanto tempo passe, nunca tornam-se antigas e obsoletas. Uma realidade como: “DEFINITIVAMENTE, DEUS NÃO MUDA AS CONDIÇÕES DE UM POVO ATÉ QUE ESTE MUDE SUAS PRÓPRIAS CONDIÇÕES” é firmemente estabelecida, relevante e verdadeira.

O Alcorão diz que devemos encarar os problemas com a força da razão e da reflexão. Uma idéia ou crença correta não deve ser rejeitada simplesmente com base no fato que outras pessoas não a aprovam, e nem deve uma idéia ou crença ser aceita simplesmente por que é comumente aceita por muitos. Em qualquer área, a pessoa deve empenhar-se na investigação e na análise profunda das questões que lhe surgem. Outro fator importante na causa de erros e que o Alcorão menciona, é seguir o ego e os desejos por motivações egoístas. Qualquer que seja a idéia que uma pessoa faça sobre algo, até que ela esteja livre dos males do egoísmo e dos interesses pessoais, ela não poderá pensar corretamente. Ou seja, razão e senso comum podem apenas agir corretamente na circunstância em que não haja interesses pessoais em ação.

Há uma história famosa sobre Allamah Hilli que apóia esse fato: Allamah Hilli foi perguntado certa vez sobre uma questão de fiqh (jurisprudência): Se um animal morrer dentro de um poço e isso resultar em impureza da água, o que deve ser feito com a água do poço? Ocorre que um animal tinha caído no poço da casa de Allamah Hilli e ele estava obrigado a deduzir tal questão para si mesmo. Havia duas medidas possíveis da lei a serem adotadas. A primeira era que o poço teria que ser fechado e não mais ser utilizado novamente, e outra era que uma certa quantidade de água teria de ser retirada para que o resto da água fosse misturada com uma quantidade de água pura para que o poço fosse usado normalmente. Allamah Hilli estava ciente que não poderia dar um parecer completamente imparcial, pois seus próprios interesses estavam envolvidos. Assim, primeiro ele ordenou que o seu próprio poço fosse interditado, e então, com liberdade de espírito e livre da pressão e dos sussurros do seu ego ele deu seu parecer.

Diz o Alcorão: NÃO SEGUEM SENÃO CONJECTURAS E A LUXÚRIA DE SEU PRÓPRIOS ÍNTIMOS…”(C. 53 – V.23).

A gnose Islâmica (irfán) emprega o termo “coração” para se referir a dimensão mais interna da criatura humana. O Alcorão igualmente refere-se ao coração como sendo a dimensão desta realidade interior da alma humana. Sempre que o Alcorão fala sobre revelação (wahí) jamais menciona a razão. Ao contrário, isto sempre se relaciona ao coração do Profeta (S.A.A.S.). O significado disto é que o Profeta (S.A.A.S.) não recebeu o Alcorão através da razão ou deduções lógicas, pois foi o seu coração que alcançou um estágio além da compreensão humana e foi nesse nível que ele se habilitou á percepção das sublimes realidades do Alcorão. Na Surata Najm isto é explicado: “ISTO NÃO É SENÃO A INSPIRAÇÃO QUE LHE FOI REVELADA, QUE LHE TRANSMITIU O FORTÍSSIMO (GABRIEL), O PORTADOR DA FORÇA, O QUAL LHE APARECEU PERFEITAMENTE QUANDO ESTAVA NO MAIS ALTO HORIZONTE E ENTÃO APROXIMOU-SE DELE Á UMA DISTÂNCIA DE DOIS ARCOS OU MAIS PRÓXIMO AINDA E REVELOU A SEU SERVO. O CORAÇÃO (DO MENSAGEIRO) NÃO MENTIU ACERCA DO QUE VIU”. (C.4 – V.11)

O Alcorão, onde fala de revelação e do coração, explica coisas de um nível superior à razão, muito embora não a contradiga. O Alcorão, nessas circunstâncias, explica um ponto de vista que está acima da razão, para a compreensão daquilo que a razão não tem acesso.

As Características do Coração

O coração, na visão alcorânica, é também um meio de conhecimento e compreensão. Uma parte da mensagem do Alcorão é endereçada ao coração. Uma parte que apenas os ouvidos do coração podem ouvir. Assim, o Alcorão enfatiza a salvaguarda e a perfeição deste canal de percepção. Repetidamente nós encontramos no Alcorão questões como a purificação do íntimo (tazkiyat annafs) e a iluminação e a pureza do coração.

“BEM -AVENTURADO SERÁ QUEM A PURIFICAR (A ALMA).” (C.91 – V.9).

“QUAL! EM SEUS CORAÇÕES HÁ UMA MÁCULA PELO QUE COMETERAM”. (C.83 – V.14)

E sobre a iluminação do coração diz:

“SE FOREM TEMENTES A DEUS, ELE COLOCARÁ EM VÓS A LUZ DO DISCERNIMENTO.” (C.8 – V.29)

De modo semelhante diz que as ações condenáveis do homem poluem sua alma e retira suas puras atrações e desejos, o que também é citado repetidamente. Os fiéis são citados a suplicar: “SENHOR NOSSO, NÃO DESVIE NOSSOS CORAÇÕES DEPOIS DE TER NOS GUIADO.” (C.3 – V.7)

E diz ainda: “PORQUE SE DESVIARAM DEUS CAUSOU O DESVIO DE SEUS CORAÇÕES” (C.61 – V.5).

Similarmente, o Alcorão fala de corações fechados, selados (em razão dos pecados):

“ASSIM DEUS SELA OS CORAÇÕES DOS DESCRENTES” (C.7 – V.101).

O Alcorão considera necessário que cada pessoa mantenha seu coração puro, sadio e preservado. Além disso, devido ao fato que na corrupção social existente os esforços de um indivíduo para manter seu coração puro na maioria das vezes resultam inúteis, o Alcorão ordena que o ser humano use todos seus esforços a fim de purificar seu ambiente social. O Alcorão aponta claramente para o fato que amor, fé, inclinações puras e corretas e mesmo o estudo religioso, tudo isso depende de que o homem e a sociedade permaneçam livres da impureza, da escravidão dos desejos, da promiscuidade, etc. A história da humanidade demonstra que sempre que um governante ou regime político pretende colocar uma sociedade sob sua autoridade tirânica e explorá-la, ele esforça-se em corrompê-la. Para fazer isso, aumenta as facilidades e os meios para a promiscuidade dos membros dessa sociedade.

Um exemplo dessa estratégia odiosa foi o desastre que se abateu sobre a Espanha Muçulmana, a qual é considerada uma das fontes da renascença e a mais avançada civilização da Europa em sua época. Os europeus, a fim de tirar a península ibérica do domínio Islâmico, iniciaram sua ação por corromper o espírito e a ética dos jovens muçulmanos. Tanto quanto lhes foi possível, eles promoveram os meios de prazer e permissividade, em tal quantidade que mesmo os oficiais e governantes foram corrompidos. Com essa estratégia eles foram capazes de por fim à força, coragem, vontade e fé de seus inimigos muçulmanos tornando-os criaturas fracas, entregues à luxúria e ao álcool. Evidentemente, triunfar e prevalecer sobre tal povo não foi uma difícil tarefa. Os europeus, em vingança pelos séculos de domínio muçulmano, perpetraram tal selvageria que a história se envergonhou em registrar. Os cristãos, que de acordo com os ensinamentos de Jesus (A.S.), eram obrigados a voltar a outra face, provocaram um mar de sangue muçulmano superando mesmo a Genghis Khan. Entretanto, a derrota dos muçulmanos foi o resultado da corrupção de sua próprias almas, abandonando a ação em acordo com o Alcorão e seus preceitos.

Mesmo na atualidade, onde quer que a exploração se apresente, se estabelece no mesmo ponto em que o Alcorão nos alerta, usando como estratégia submergir os corações em corrupção. Uma vez que o coração se corrompe, a razão rende-se inútil, e isso torna ainda mais forte a corrente que aprisiona o homem. Assim, vemos que a exploração e o capitalismo não temem abrir escolas e universidades, embora sua estratégia seja conhecida pelos muçulmanos, eles usam todos seus recursos e esforços para corromper os estudantes. Eles estão bem cientes do fato que um coração e uma alma que está doente não oferece resistência e submete-se a toda espécie de baixeza e exploração. O Alcorão dá grande importância à nobreza e santidade do espírito da sociedade. Diz o Alcorão: “AUXILIAI-VOS NA VIRTUDE E NA PIEDADE. NÃO VOS AUXILIEIS MUTUAMENTE NO PECADO E NA HOSTILIDADE”. (C.5 – V.2)

O versículo indica a ordem à prática do bem e das ações nobres e não das ações impuras e más, e isto é dito para ser feito por todo o conjunto da comunidade. É relatado nos livros de biografia do Profeta (S.A.A.S.) que certa vez um homem foi procurá-lo e disse a ele que tinha algumas coisas a perguntar. O Profeta (S.A.A.S.) perguntou se ele queria que lhe fossem dadas as respostas ou se ele queria perguntar. O homem disse que queria as respostas. O Profeta (S.A.A.S.) então disse a ele: “Você veio me perguntar o significado do comportamento bom e digno e do comportamento mal e impuro”.

O homem admitiu que era exatamente isso. O Profeta (S.A.A.S.) bateu levemente com três dedos sobre o peito do homem e disse-lhe para pedir a resposta de seu próprio coração e acrescentou “O CORAÇÃO DO HOMEM É FEITO DE TAL MODO QUE ESTÁ LIGADO AO QUE É BELO E BOM, COM O QUE É NOBRE (BOM) ELE SE TORNA ALIVIADO E CALMO, PORÉM, COM O QUE É MALIGNO E RUIM ELE SE TORNA PERTURBADO E ATRIBULADO.”

Assim como uma matéria que não é homogênea com o organismo humano quando entra no corpo provoca mal estar e indisposição, e o funcionamento de vários órgãos se desarranja, do mesmo modo a alma humana torna-se confusa e perturbada com ações indignas. Aquilo que é comumente chamado de consciência pesada origina-se dessa absoluta falta de harmonia entre o coração e o mal.

Consta que o Profeta (S.A.A.S.) tenha dito: “BUSCAI A OPINIÃO DE VOSSO CORAÇÃO, MESMO SE OS JUÍZES DEREM OPINIÃO CONTRÁRIA”.

O que o Profeta (S.A.A.S.) nos diz é que se uma pessoa realmente busca a verdade e, a fim de fazer isso, coloca-se neutra e imparcial, seu coração não a trairá. Ao invés disso, ele o guiará à senda correta. Fundamentalmente, por quanto tempo que o ser humano seja um sincero buscador da verdade, a verdade e a realidade chega até ele. Naturalmente, este é um ponto sutil o qual com freqüência conduz a erros e más interpretações. Sempre que um homem é levado a um caminho errado, a razão é que, desde o início, ele tinha uma motivação duvidosa, e não estava buscando a verdade puramente pela busca em si do que é certo. Em resposta a um homem que lhe inquiriu sobre o significado de “retidão”, o Profeta (S.A.A.S.) respondeu que se ele verdadeiramente estava procurando a retidão, ele teria que saber que tudo o que tornasse seu coração satisfeito e sua consciência calma seria Retidão, enquanto que sempre que ele estivesse desejoso de algo que não trouxesse paz a seu coração, com certeza essa coisa seria pecado. Similarmente, o Profeta (S.A.A.S.) foi perguntado sobre Fé. E respondeu: “A PESSOA QUE SEMPRE QUE UMA MÁ AÇÃO É COMETIDA, SENTE DESCONFORTO E LAMENTA, E SEMPRE QUE UMA BOA AÇÃO É FEITA, SENTE-SE BEM E FELIZ ESTÁ DOTADA DE FÉ.” É narrado do Imam Sádiq (A.S.) que tenha dito: “UMA PESSOA QUE CRÊ É AQUELA QUE SEMPRE QUE ESTÁ LIVRE DOS ASSUNTOS MUNDANOS, SENTE A DOÇURA DO AMOR DIVINO EM SEU CORAÇÃO, E ENTÃO LHE PARECE QUE O MUNDO É SEM VALOR, E COM TODO SEU SER ELE DESEJA DESPREZAR O MUNDO E DEIXÁ-LO PARA TRÁS. E ESTA É UMA REALIDADE QUE OS AWLIIA (PRÓXIMOS DE DEUS) TEM PROVADO COM SUA PRÓPRIAS VIDAS.

Na biografia do Profeta (S.A.A.S.) está relatado que um dia, depois da prece da aurora, o Profeta (S.A.A.S.) foi ver as pessoas que eram chamadas de Ashaba Suffah. Esses eram muçulmanos pobres de Medina que não possuíam bens materiais e que viviam junto a Mesquita do Profeta. O Profeta olhou para um deles, que se chamava Zaid (Hareth Ibn Zaid), e viu que ele parecia muito magro e fraco, e que seus olhos estavam fundos. “Como vai você?” perguntou o Profeta. O homem respondeu: “Eu estou passando por esta manhã como um dos que alcançaram a certeza (ahlul yaqin). O Profeta disse: Esta é uma grande afirmação, e quais são as provas disso? “As provas do meu estado de certeza é que o sono é tirado de mim a noite e eu estou sempre jejuando durante o dia. E eu passo minhas noites até o amanhecer no îbad (adoração).” O Profeta respondeu: “Isto não é suficiente, o que mais?” O homem disse: “Ó Rasul, agora eu estou em tal condição que parece como se eu estivesse vendo as pessoas do paraíso e as pessoas do inferno e ouvindo sua vozes.Se deres a tua permissão, eu relatarei as condições de ambos.” “É suficiente, é suficiente” respondeu o Profeta, e perguntou: “Dizei-me, qual a tua aspiração?” “Jihad fi sabílillah (ESFORÇO NA CAUSA DE DEUS)”, respondeu o homem.

O Alcorão aponta para o fato que a purificação do coração dá ao homem tal posição que, nas palavra do Imam Ali Amr ul Muuminin (A.S.), “se o véu fosse retirado de sua visão, nada acrescentaria a sua certeza”.

O que o Alcorão visa em seus preceitos é o crescimento da criatura humana, que aproveitará do conhecimento, da razão e das vias do coração e usará isso da melhor maneira na senda da Verdade, criatura humana de cujos os melhores exemplos são o Profeta (S.A.A.S.), seus mensageiros antecessores (A.S.), os Imames (A.S.) e seus sinceros e devotados seguidores.

Extraído da obra “UNDERSTANDING THE QUR’ÁN”

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