Compreendendo a Realidade do Islam e dos Muçulmanos

Por: Ahmed Ismail.

Nenhuma das grandes tradições religiosas desperta maior estranheza ao Ocidente do que o Islam. Preconceitos seculares, noções errôneas e generalizações gravitam e formam o desconhecimento profundo do Ocidente sobre o chamado mundo islâmico. Porém, mais do que o mero desconhecimento, é a desinformação que reafirma preconceitos e distorce a realidade. Quais as razões disso? O que pode explicar o abismo entre Ocidente e Oriente? Na verdade, ao tratarmos dessas questões vemos que, há uma razão natural que é a própria condição de diferença. Todas as culturas e civilizações em toda história coexistiram dentro dessa tensão natural do contato com o que é diverso. Contudo, no caso do Ocidente e do mundo Islâmico há muitas outras razões e fatores envolvidas. A razão natural da pura diferença não produz uma situação de conflito e nem é suficiente para impedir o surgimento de um diálogo. Portanto, o muro erguido entre o Ocidente e o Oriente Islâmico tem sua origem em muitas outras razões e fatores, de natureza política, filosófica e histórica. Ao abordarmos estas razões e fatores, chamamos a atenção para um agente de grande importância neste processo de perpetuação do preconceito em relação ao Islam e os muçulmanos, e da impossibilidade do diálogo com o mundo islâmico: há uma forte oposição e sistemática campanha contra o Islam no mundo ocidental. Quem são seus protagonistas e o que pretendem? Quais são suas motivações? Para que tenhamos as respostas para estas perguntas é necessário que destaquemos duas características peculiares do Islam.

A primeira está relacionada a política. Diferentemente de todas as demais grandes tradições religiosas, o Islam é um sistema integral de pensamento e ação, ou seja, não separa a Religião da Política, o aspecto teológico do Estado. Propõe uma efetiva e profunda transformação da mentalidade humana e da sociedade e, não apenas em teoria, o estabelecimento de um Estado Divino (ou o Reino de Deus) na terra e o consequente Governo da Justiça. Segundo o Islam, o propósito e o plano Divino é o estabelecimento da Justiça na terra. Portanto, o Estado e a política devem estar submetidos a este Plano Divino. Naturalmente, os poderosos do mundo formam fileiras em oposição ao Islam. Se veêm ameaçados diante da expansão de uma fé que propõe uma Nova Ordem, que significaria a queda de todos os sistemas políticos e sociais injustos, a destruição do culto ao dinheiro, o fim do materialismo, da ignorância, da exploração e dos muitos outros males que impedem a paz e o bem estar da humanidade. Males dos quais os inimigos do Islam dependem para continuarem poderosos.

A integridade da Mensagem Islâmica é para estas forças opositoras uma ameaça real, pois sabem que o Islam conta com esse poder transformador no indivíduo e na sociedade (já demonstrado na história) que o capacita a triunfar onde todas as outras tradições religiosas anteriores falharam.

A segunda característica está relacionada a perspectiva teológica. O Islam reivindica a fé monoteísta estrita, a qual denomina a pura fé monoteísta de Abraão. Por conseguinte, rejeita todos os dogmas e crenças forjados pelos homens, manipulados para dominar as consciências. Por conseguinte, os que sempre dominaram os povos por meio da religião e os que lucram com ela, compõem um segundo grupo de ferrenhos opositores ao Islam.

Historicamente, essa posição de conflito é mais antiga e em considerável medida foi a razão do choque expansionista entre a civilização européia cristã, capitaneada pela Igreja Romana, e o mundo islâmico durante as Cruzadas na Idade Média. Contudo, este conflito de caráter teológico ressurgiu a partir do Século XIX, com o avanço imperialista do Ocidente e está presente na atualidade nas novas cruzadas evangelizadoras de diversas seitas protestantes que, encontram no Islam, um poderoso entrave para sua expansão.

Estas duas características do Islam, a política e a religiosa, dão origem a outras frentes de conflito com o Ocidente: o conflito filosófico, o conflito cultural e o conflito econômico.

O conflito filosófico se justifica uma vez que Oriente e Ocidente possuem visões de mundo absolutamente opostas. O pensamento ocidental é fundamentalmente laico e laicizante, enquanto o pensamento islâmico é centrado na Religião, como base determinante para os costumes, a política e a sociedade.

O conflito cultural assume um aspecto de difícil solução, uma vez que o avanço político e econômico do ocidente sempre se caracterizou pela supressão das culturas locais com uma conseqüente aculturação ou o que chamamos de colonização cultural. Os valores e costumes ocidentais são implantados em toda parte, desconsiderando e descaracterizando os valores culturais e os costumes dos povos. Porém, essa aculturação encontra forte resistência no mundo islâmico. Os valores culturais consagrados no ocidente de modo geral, são condenáveis pelo Islam. Por conseguinte, os que se empenham em colonizar culturalmente o mundo islâmico compõem um outro grupo de opositores do Islam.

O conflito econômico é decorrente do anterior. Uma série de empreendimentos ocidentais ligados aos seus valores culturais são emperrados no mundo islâmico, por confrontarem os valores e costumes do Islam. São exemplos disso, a indústria de entretenimento, a indústria da moda, de bebidas alcoólicas e a indústria pornográfica. Portanto, o Ocidente encontra no Islam um obstáculo a seus interesses econômicos no mundo. Este conflito econômico também diz respeito à importância estratégica do Oriente Médio no xadrez da política mundial. As abundantes reservas de petróleo da região têm sido fator determinante na instabilidade da região. É bem conhecido o fato de que a ambição pelo controle dessas reservas foi uma das motivações principais para a invasão militar americana do Afeganistão e do Iraque.

Creio que estão bem evidentes as razões que movem a sistemática campanha contra o Islam levada cabo por seus opositores no mundo ocidental. São os interesses das potências ocidentais e das grandes corporações multinacionais, os interesses do sionismo internacional e de seus aliados cristãos (grande parte das seitas e movimentos evangélicos) que estão em jogo. Grandes somas de dinheiro são gastas anualmente por todos eles, para disseminar a distorção da imagem do Islam, para corromper e dividir os muçulmanos, para destruir os valores islâmicos dentro dos países de maioria muçulmana e para financiar intervenções militares como a que está em curso no Iraque e no Afeganistão.

A ação do ocidente neste campo, segue duas linhas estratégicas bem definidas: a primeira, é de caráter puramente imperialista. Trata-se de uma atuação dentro do mundo islâmico com o intuito de enfraquecer as bases da cultura e destruir a identidade das populações muçulmanas; estabelecer sua influência econômica e política apoiando regimes corruptos e tirânicos, explorando as rivalidades tribais e étnicas. Esta diretriz imperialista reacendeu, no curso do século XX, um profundo ressentimento ao Ocidente e seus valores e este ressentimento transformou-se em consideráveis parcelas das sociedades islâmicas do Oriente Médio, no “ódio ao ocidente” pregado pelos grupos integristas que hoje recorrem ao terrorismo.

A segunda linha estratégica, que é o objeto deste trabalho, é a campanha ideológica com a intenção de distorcer a imagem do Islam e dos muçulmanos no mundo perante os ocidentais. Com efeito, esta campanha implica num esforço contínuo de desinformação. Engajada neste esforço, a indústria cultural assume um papel preponderante. Filmes, livros, documentários e até desenhos são produzidos com a intenção de fortalecer preconceitos e idéias distorcidas, na sua grande maioria forjadas na Idade Média pelos teólogos cristãos que não tinham escrúpulos em alimentar o fanatismo contra seus opositores. A grande mídia do ocidente também trabalha nesse sentido enfatizando continuamente “o terrorismo islâmico” com uma análise simplista da questão de modo a passar a idéia de que o Islam é uma religião ligada ao terror, de que o Islam se opõe a modernidade e aos valores democráticos. Estes dois vetores do preconceito e da distorção da realidade merecem uma mais acurada análise:

A produção cultural direcionada a alimentar preconceitos e falsas noções sobre o Islam, o mundo islâmico e os muçulmanos não é uma estratégia nova. Obras literárias são produzidas com essa intenção no Ocidente desde o século XVI. Porém, a indústria cultural do ocidente tem dedicado maior atenção a isso desde o final dos anos 70. A resistência palestina e principalmente a Revolução Islâmica iraniana, tornaram-se os temas favoritos para filmes e livros que apresentavam o mundo islâmico como um domínio do terror, do fanatismo e da tirania. A demonização promovida pela mídia ocidental em torno da figura de Ayatullah Khomeini (que chegou a ser apresentado no ocidente como um anti-cristo) foi ainda mais explorada após o lançamento do livro “Versos Satânicos”. Salman Rushdi, seu autor, foi celebrado no ocidente como “um herói da liberdade de expressão”. O livro em questão trazia uma versão insultante e caluniosa da vida do Profeta do Islam. Naturalmente, despertou a indignação de muçulmanos no mundo inteiro e por fim, a condenação pública por parte do Líder da Revolução Islâmica Iraniana por heresia. Ao que parece, o único mérito do autor (suficiente para ganhar apoio, admiração e dinheiro do ocidente) foi ofender o sentimento religioso de um quinto da população mundial. Desde então, periodicamente lançam-se livros “denunciando os costumes bárbaros do mundo muçulmano”, que prontamente se tornam, com uma bem realizada campanha publicitária, em best-sellers, que, invariavelmente, por sua pobreza literária caem no esquecimento anos depois.

Na área cinematográfica a enxurrada de produções (em sua maioria de baixíssima qualidade) que inunda as telas do mundo inteiro, com o claro propósito de propaganda contra o Islam e os muçulmanos, se intensificou após a queda do comunismo. Abusando de estereótipos e “interpretando os conflitos do oriente médio segundo a visão das grandes potências do Ocidente, compõem um importante meio de difusão das idéias dos inimigos do Islam. Note-se que, Holywood, repleta de acionistas abertamente apoiadores do sionismo, jamais teve escrúpulos em levar as telas do mundo inteiro as noções mais absurdas e criminosas sobre o Islam e os muçulmanos. Seus estúdios estão sempre a disposição dos produtores sionistas ou simpatizantes destes, para aquilo que chamam de “propaganda cívica e de luta pela democracia”. Seguros de que “imagens falam mais do que fatos” (no que, até certo ponto não estão errados) continuam incitando a guerra e o ódio; e ganhando muito dinheiro com isso.

Na realidade, a indústria cultural ou a cultura de massa responde não apenas a uma intenção política e ideológica, e utiliza frequentemente o argumento da exploração dos assuntos polêmicos porque esses assuntos vendem livros e revistas. Porém, há um outro lado dessa campanha anti-Islam, ainda mais lamentável do que este.

A cultura acadêmica de modo geral, negligencia o valor e a história da civilização islâmica, inclusive como um dos fatores que possibilitaram o desenvolvimento tecnológico e científico do ocidente. A despeito da grande contribuição da civilização islâmica em muitos ramos da ciência, da filosofia e das artes, a cultura acadêmica tende a omitir tudo isso.

A grande mídia ocidental por sua vez, se caracteriza por uma abordagem negativa, que pauta toda e qualquer notícia ou assunto relacionado ao Islam, ao mundo islâmico e os muçulmanos.

Todas as grandes tradições religiosas e especialmente as divinamente reveladas, possuem valores elevados e altruístas e riqueza espiritual, e como tradições, também se desenvolvendo pela ação humana, com todos os problemas e conflitos que isto implica, todas essas tradições religiosas possuem em suas fileiras fanáticos, seitas heréticas, fundamentalistas. Tais manifestações anômalas de religiosidade são inerentes ao ser humano e estão presentes em todas as épocas e em todas as grandes tradições religiosas do mundo. A abordagem que a grande mídia dá, de modo geral, a todas estas grandes tradições religiosas (cristianismo, budismo, judaísmo, etc,) é uma abordagem positiva que ressalta o que há de belo em seus valores espirituais e místicos e em sua filosofia. De modo similar, há uma vasta literatura lançada no ocidente realçando a riqueza espiritual dessas tradições. Contudo, no caso específico do Islam não se dá o mesmo. Muito ao contrário. A abordagem da Grande Mídia do Islam, do mundo islâmico e dos muçulmanos, com raríssimas exceções, é uma abordagem profundamente negativa que busca sempre reafirmar a ligação terrorismo-Islam, como também identificar a cultura e a religião islâmica com a intolerância, o obscurantismo, o fanatismo, a crueldade com as mulheres, o atraso e o “ódio ao ocidente,” como se todos esses males se devessem ao Islam e não existissem em nenhuma outra tradição religiosa (o que é um embuste).

Ainda em relação ao terrorismo internacional e a propaganda anti-islâmica, sob o pretexto da “liberdade de expressão” setores da mídia européia protagonizaram recentemente uma das mais grosseiras ações de discriminação ao Islam. Jornais europeus publicaram charges ofensivas ao Profeta do Islam sugerindo que o terrorismo fazia parte do Islam. A indignada reação de muçulmanos do mundo inteiro não levou-os a reconsiderarem seus atos, apenas algumas pessoas sensatas manifestaram publicamente que a liberdade de expressão não significava liberdade para a ofensa religiosa. Descobriu-se pouco depois que charges sobre Jesus tinham sido censuradas pelos mesmos “defensores da liberdade” para não ofenderem os cristãos. É interessante que, nem antes nem depois houve qualquer exemplo do tipo, envolvendo a figura de Buda, Moisés ou Jesus, isto é, a ofensa em nome da liberdade de expressão só é aceitável pela imprensa européia contra o Islam e os muçulmanos.

Toda a riqueza espiritual e a sabedoria islâmica, que foi um importante legado ao ocidente na Idade Média, todos os valores altruístas e elevados do Islam são cuidadosamente omitidos. O cidadão médio do ocidente, acostumado com as análises superficiais e as imagens truncadas dos telejornais, ou as análises políticas parciais e comprometidas com os interesses das grandes potências ocidentais, o mundo islâmico, o Islam e os muçulmanos representam “um mal , uma ameaça.” Tal abordagem da mídia não só exclui qualquer fato ou valor positivo que exista no Islam e no mundo islâmico, como também omite manifestações de fanatismo cristão, como a auto-flagelação de freiras filipinas ou nesse mesmo país os fiéis católicos que se crucificam na sexta-feira santa, ao mesmo tempo que todos os anos enfatizam as cenas de auto-flagelação de muçulmanos de seitas xiitas no Líbano e no Irã, na ocasião do aniversário do martírio de Imam Hussein (A.S.). A opinião pública ocidental pouco ou nada sabe do atuante e igualmente ameaçador fundamentalismo cristão, judeu ou budista, ignora que a campanha da invasão do Iraque não seria possível sem o apoio irrestrito de diversas seitas fanáticas evangélicas e que o próprio George Bush é um fundamentalista cristão, tão fanático quanto qualquer militante da Al Qa’idah.

Antes de tratarmos de algumas das muitas falsas generalizações utilizadas no ocidente em relação ao Islam, ao mundo islâmico e os muçulmanos, é importante que abordemos dois outros fatores que estão implicados neste processo de distorção da imagem do Islam.

Um deles é um fator ligado a racionalidade. O que muito contribui para que não se compreenda o Islam, e para que os preconceitos e as falsas noções se propaguem é uma tendência infelizmente predominante no mundo ocidental. Há tanto nas camadas populares como entre muitas pessoas tidas como cultas, uma inclinação para seguir noções superficiais sobre as coisas. O que torna possível a propagação de tudo o que seja falso ou fantasioso. Esta é uma condição de ignorância que leva muitos a seguir o erro e não buscar conhecimento correto. De modo geral, os que opinam sobre o Islam e o mundo Islâmico, os chamados “especialistas” que escrevem livros e entrevistas sobre o assunto, sabem muito pouco ou nada, ou o que é pior, tem suas mentes cheias de preconceitos e tendem a interpretar as coisas segundo as conveniências dos que são inimigos do Islam. Então, o que temos é aqueles que nada sabem e se passam por conhecedores e aqueles que seguem cegamente tudo que ouvem.

O outro fator implicado no processo de distorção da imagem do Islam, e que produz graves problemas na comunidade islâmica mundial é a existência de inimigos internos. Estes inimigos do Islam se dividem em dois grupos principais. O primeiro deles historicamente tem agido desde os primeiros tempos do Islam, compõe-se dos hipócritas que sempre se empenham em tomar o poder político e manipular a fé do povo comum para perpetuar-se neste poder. Quando o detém, se caracterizam por sua tirania, crueldade e por seu comportamento pecaminoso. O ocidente sempre buscou ressaltar essas características chamando a atenção para os haréns dos califas otomanos, propagando os maus exemplos desses homens como se isso fosse o Islam. Em nossa época, o ocidente comumente acusa o mundo islâmico por suas ditaduras e conseqüente ausência de liberdade e democracia, a situação de atraso, de analfabetismo e marginalização das mulheres em muitos países do oriente médio e do Maghreb, atribuindo esses males ao Islam, quando na realidade é o contrário, o Islam não autoriza nenhum desses males. O poder desses hipócritas e criminosos só é possível graças ao apoio político e econômico que recebem do ocidente. Na atualidade estes governos corruptos atuam em nome do ocidente para inviabilizar o estabelecimento de estados islâmicos autênticos, refreando e reprimindo os movimentos islâmicos. Em alguns países, como a Arábia Saudita, amparados numa interpretação distorcida da fé islâmica, mantém a sociedade dentro de costumes tribais e em outros, como na Turquia, impõem um movimento crescente de laicização e adoção dos costumes ocidentais, mantendo o Islam limitado aos aspectos rituais e tradicionais.

Esta situação gerou um outro grande mal, que está relacionado ao segundo grupo de inimigos internos do Islam: os integristas. Este segundo grupo encontra no discurso do “ódio ao ocidente” a base de argumentação e de interpretação do Jihad (esforço pela Causa de Deus). Sob o pretexto de uma luta pelo Islam, cometem crimes e atentados covardes contra inocentes indiscriminadamente, alimentando discórdia e divisões dentro da comunidade islâmica, combatendo mesmo os muçulmanos que não pensam como eles. Um grande mal que produzem com suas ações é que, os verdadeiros combatentes do Islam, os grupos que lutam por causas justas de libertação e não fazem de inocentes os seus alvos; os que respeitam os lugares sagrados e a vida dos muçulmanos e de todos aqueles que não os combatem, e também aqueles que estão comprometidos com o Dâwah (propagação da religião) no ocidente, são igualmente tachados de fanáticos e muitas vezes perseguidos. Com isso, os governos das grandes potências inimigas do Islam podem afirmar sua “propaganda mentirosa” que tenta “demonizar” a luta justa e necessária de sunitas e xiitas para a retirada das tropas anglo-americanas do território do Iraque, a luta do povo palestino por seu território, do povo checheno, do povo da Cachemira, rotulando-as como “terrorismo” ao lado da Al Qa’idah.

Falsas Generalizações

Os detratores do Islam no ocidente se utilizam de duas abordagens igualmente falsas: as noções errôneas ou a distorção da realidade, e as generalizações. A primeira tem origem na história de conflito entre a cristandade e o mundo islâmico. Trataremos desse tema posteriormente. A segunda, parte dessas mesmas noções errôneas que tem sido utilizadas num processo de desinformação, muito em voga especialmente após os atentados de 11 de setembro, quando a atenção do ocidente se voltou para o mundo islâmico. Na realidade, estas falsas generalizações resultam em grande medida da abordagem superficial da grande mídia que, por razões variadas destina pouquíssimo espaço para uma análise apurada dos fatos; e quando o faz não consegue se desvencilhar dos seus comprometimentos, de sua parcialidade e preconceitos. As generalizações mais comuns sobre o assunto são:

a) Islam, Mundo Islâmico e Civilização Islâmica

Não é correto confundir Islam (a religião) com o chamado mundo islâmico ou civilização islâmica. A religião não é tudo o que fazem dela e em nome dela. Assim como não podemos confundir cristianismo (ou a mensagem de Jesus) com a cristandade ou com o que os denominados cristãos fizeram e fazem em nome do cristianismo, também não podemos confundir o Islam (a mensagem revelada a Mohammad e aos demais profetas) com o que os muçulmanos fazem ou fizeram em nome dessa mensagem. A civilização islâmica ou o mundo islâmico é um fenômeno humano, assim como a cristandade, e como tal, corresponde a um conjunto de fatores sociais, políticos e históricos que necessariamente não refletem os valores religiosos do Islam.

O mundo islâmico é um vasto e diversificado conjunto de 55 nações e importantes minorias espalhadas por todo o mundo. Formam culturas distintas, possuem idiomas variados, problemas políticos e sociais diversos. Em cada uma dessas nações há costumes e práticas não-islâmicas e questões políticas que nada tem a ver com o Islam.

A generalização causa a falsa idéia de que os problemas políticos e sociais do mundo islâmico sejam decorrentes da religião.

b) Islam, Arabismo ou Causa Árabe

Não é correto confundir muçulmanos com árabes ou turcos. Os árabes compõem hoje algo em torno de 18% dos muçulmanos do mundo. Os problemas políticos do mundo árabe não são necessariamente relacionados ao Islam. Os conflitos tribais no Oriente Médio não são diferentes dos conflitos da África não-islâmica, apenas são super-dimensionados pela importância estratégica da região. Arabismo, nacionalismo árabe ou causa árabe são movimentos políticos (de nuance laica) que em certos momentos do século XX mobilizaram nações árabes em torno de uma luta de afirmação e independência. Muitos dos seus líderes eram árabes cristãos. O mundo islâmico abrange como já dissemos vários povos e etnias não-árabes. Indonésios, chineses, persas, turcos, curdos, etc; e para todos esses povos e etnias os conceitos de arabismo ou nacionalismo árabe são absolutamente estranhos.

c) Jihad, Guerra Santa, Terrorismo

O conceito de “Guerra Santa” é um conceito criado pela cristandade durante as Cruzadas. Não existe no Islam. O Jihad (Esforço na Causa de Deus) não é e nunca foi algum tipo de guerra santa, com o objetivo de “converter à força” ou matar os não-muçulmanos, como aquelas que a Europa Cristã empreendeu contra o Oriente há alguns séculos atrás. Jihad é o esforço na defesa da justiça, da religião e da comunidade, ordenado por Deus. Trata-se do direito universalmente consagrado do direito de um povo a defender-se, a lutar se necessário, quando esteja submetido a opressão, tirania, perseguição ou condições injustas, quer seja em seu território ou na sua liberdade de crença e prática religiosa. Este esforço não significa necessariamente guerra e muito menos se relaciona a atos terroristas.

Fanatismo e terrorismo não são fenômenos exclusivos do Mundo Islâmico, como a imprensa ocidental tenta nos convencer. A existência de grupos extremistas na Irlanda Cristã, de seitas fanáticas evangélicas como a Ku Klux Klan ou grupos fanáticos judaicos em Israel e Eua, é conhecida, porém, há um empenho constante na Grande Mídia ocidental em aliar fanatismo e Terrorismo a Islam. A ocorrência do terrorismo em várias culturas e religiões (e também em ideologias puramente políticas e nacionalistas) demonstra que suas raízes residem em fatores sociais e políticos, situações em que grupos encontram como única alternativa de luta o extremismo. Muitas nações, inclusive nações que hoje dizem estar engajadas na luta contra o terror, empregaram táticas e atos terroristas em vários momentos de sua história, como Israel.

Não é aceitável que se confunda toda luta revolucionária, ou toda luta justa de povos em situação de opressão ou de ocupação estrangeira, com terrorismo. Tampouco podemos dizer que todos os atos terroristas perpetrados por grupos em nome do Islam, sejam autêntico Jihad ou correspondam a um direito real e justo.

Falsas Noções, o Desconhecimento Favorecendo o Erro

Tememos o que não conhecemos. Este é um fato estabelecido na psique humana. As falsas concepções forjadas contra o Islam durante as Cruzadas pelos téologos fanáticos da Igreja, só puderam se perpetuar através de séculos em virtude do longo período de ausência de diálogo entre Oriente e Ocidente; período que se seguiu ao final da Idade Média. Mesmo as mentes mais esclarecidas dessa época, não contaminadas pelo obscurantismo religioso, também contribuíram para que idéias preconceituosas em relação ao mundo islâmico se disseminassem. É observável em muitos escritos dos séculos subsequentes um esforço para negar qualquer significativa contribuição dos sábios árabes e persas a cultura e a ciência que se desenvolvia no ocidente. Durante este periodo, escritores recorreram as idéias distorcidas sobre o Islam e os muçulmanos, produzindo uma literatura impregnada de falácias e preconceitos. Orientalistas muito inclinados à idéia de uma superiodade da civilização ocidental buscavam interpretar o pensamento oriental de uma maneira bastante bizarra.

Houve uma reaproximação no séc. XIX, quando o avanço imperialista ocidental no Oriente possibilitou um contato cultural. Porém, no séc. XX razões políticas tornaram a arruinar esta reaproximação. A criação do Estado de Israel dentro do mundo árabe, obra das potências ocidentais e os conflitos resultantes, tudo isso produziu a situação atual.

Portanto, as falsas noções que se seguem tiveram origem séculos atrás e têm sido mantidas graças à ignorância e a ação de mentes mal intencionadas. Encontram-se em livros, folhetos de proselitismo evangélico, na mídia escrita e televisada e até mesmo em livros didáticos.

1) “Que o Islam é uma religião hostil aos cristãos, e que os muçulmanos são inimigos de Cristo”

Islamismo, judaísmo e cristianismo são três tradições religiosas originadas de Abraão. Essencialmente crêem nos mesmos fundamentos e não há hostilidade básica ente elas (a não ser para os fanáticos das três). O Alcorão ordena o respeito aos cristãos, a seus monges e templos. Também ordena que o Estado islâmico proteja as minorias cristãs, judaicas e zoroástricas existentes em seu território. Desde o estado instituído pelo Profeta em Medina, existiram importantes comunidades cristãs e judaicas no mundo islâmico vivendo em paz e segurança, cultuando a Deus segundo suas crenças. O Estado Islâmico tem o direito de exigir um tributo dessas comunidades e de exigir que não alimentem revoltas ou sedições ou ainda que não pratiquem proselitismo em relação aos muçulmanos.

O Profeta (S.A.A.S.), no cumprimento de sua missão, se dirigiu aos cristãos e judeus com respeito e dialogou com eles. Ordenou pessoalmente e por escrito decretou a proibição de qualquer agressão ou perturbação dos monges e seus monastérios. O Alcorão ordena a proteção e o respeito as igrejas e sinagogas.

Quando os primeiros muçulmanos, perseguidos pelos idólatras árabes saíram de Makka, foram acolhidos e protegidos pela comunidade cristã etíope. Portanto, o Islam não é por princípio, hostil aos cristãos. A hostilidade recíproca surgiu por razões outras no decorrer da história.

O Islam ordena a busca do entendimento com aqueles que se inclinam para a paz e também ordena a luta e a resistência contra os agessores. Contudo, esta disposição tem razão de ser em virtude da agressão e não pela fé professada. Durante todo o período das Cruzadas, as comunidades judaicas foram protegidas pelos governos islâmicos da sanha fanática dos exércitos cristãos que eram incitados pelos clérigos católicos a perseguir a população judaica. O que aconteceu na Península Ibérica aos judeus, após a saída dos muçulmanos, quando caíram nas mãos das autoridades católicas e bem conhecido. O conflito árabe-israelense teve início com a colonização judaica patrocinada pelo ocidente e a criação do estado de Israel, já no século XX, é um conflito essencialmente político, embora possua argumentações religiosas de ambas as partes envolvidas.

Os muçulmanos não são e nem podem ser “inimigos de Cristo”. Uma vez que o Alcorão e a tradição profética atestam que Jesus (A.S.), filho de Maria (A.S.), o Messias dos Judeus, foi um nobre Profeta de Deus e que será um dos sinais do fim dos tempos. A oposição à cristandade e aos seus maus seguidores, aos que se utilizam de uma pretensa fé em Jesus para obrar a corrupção, não deve ser entendida como uma oposição a Jesus. Tais embusteiros não o seguem, são inimigos da verdade, e os verdadeiros inimigos da mensagem de Jesus (A.S.).

2) “Que o “Deus” dos muçulmanos não é o Deus dos Cristãos”

Esta falsa crença provavelmente surgiu durante as Cruzadas. Teólogos cristãos ávidos por incitar as massas ignaras da Europa à guerra contra o mundo islâmico, lançaram esta caluniosa crença. Segundo a posição da Igreja na época, judeus e muçulmanos seriam “infiéis” por não aceitarem a filiação divina de Jesus e outras doutrinas forjadas por eles. Esta crença se cristalizou durante o longo período de ausência de diálogo entre o Ocidente e o Oriente. Na atualidade, prosélitos e pastores evangélicos (por ignorância ou malícia) são os principais propagadores dessa tolice. Sua característica intolerância a todos que crêem de modo diferente ao deles, os leva a identificar os muçulmanos aos povos pagãos que viviam no oriente médio nas épocas bíblicas. Por trás dessa crença há a intenção de tornar impossível qualquer entendimento respeitoso entre cristãos e muçulmanos.

Sendo uma tradição nascida de Abraão, o Islam é uma fé monoteísta e o Deus referido no Alcorão é o mesmo e único Deus, o Deus de Abraão, de Ismael, de Issac, de Jacó e de Jesus. O Alcorão ordena aos fiéis a abraçarem a Fé de Abraão, a fé monoteísta original, livre dos desvios e inovações dos chamados povos do livro (cristãos e judeus).

Allah é o nome de Deus em idioma árabe, assim como Jahveh (ou Jah) o é em Hebraico ou God em inglês, assim, mesmo os cristãos árabes utilizam o nome Allah ao se referirem a Deus.

3) “Que a condição da mulher no Islam é de submissão ao marido.”

No Islam, só existe submissão a Deus. O Alcorão não afirma nenhuma submissão da mulher ao homem, como a bíblia o faz no velho e no Novo Testamento. Para o Islam o homem não é dono da mulher e nem ela lhe é inferior. Não há nada no Alcorão ou na tradição fiel que possa servir de base para isso. Infelizmente, em muitas sociedades tribais da Ásia e da África prevalecem costumes e práticas que muitas vezes oprimem a mulher. As pessoas sem um devido conhecimento tendem a confundir estas práticas e costumes com costumes islâmicos, quando na realidade, nada têm a ver com o Islam.

O fato do Islam ter uma posição divergente à do Ocidente no que se refere aos direitos do homem e da mulher, isto é, o ocidente na atualidade consagra a idéia de igualdade de direitos, enquanto o Islam proclama a equivalência de direitos do homem e da mulher, tem sido suficiente para que o Ocidente acuse o mundo islâmico de retrógrado. Não me aprofundarei nesta questão, visto que é um assunto que requer uma longa exposição. Apenas devo dizer que o uso do véu (hijab) não faz da mulher muçulmana um ser oprimido. Deveriam as pessoas que pensam assim, refletir sobre a verdadeira condição da mulher no ocidente, sobre que tipo de respeito e dignidade, que tipo de papel a sociedade moderna tem reservado a mulher. Situações discriminatórias à mulher no chamado mundo islâmico ocorrem pelas mesmas razões já apontadas. Porém, não há como generalizá-las. Se por um lado, na Arábia Saudita, dirigida por uma seita herética que abusa do Islam, a mulher não pode sequer dirigir um carro, por outro, no Irã xiita, as mulheres são a maioria nas universidades, assumem postos no governo e na justiça.

4) “Que a revelação teria sido algum tipo de alucinação do Profeta, e que este, padeceria de alguma enfermidade mental.”

No período das cruzadas, os teólogos cristãos, como não podiam aceitar a condição profética de um homem cuja doutrina se opunha a seus dogmas, lançaram mão desse argumento, sem qualquer prova histórica ou qualquer relato confiável de qualquer contemporâneo do Profeta. De qualquer maneira lançaram-se a propagar tal argumento por todo mundo cristão: de que o Profeta do Islam sofreria de alguma perturbação mental que o fazia imaginar ver e ouvir o Arcanjo Gabriel. Com isso, tais teólogos cristãos tentavam explicar a revelação do Alcorão. Uma vez que não havia absolutamente nada na biografia do Profeta que pudesse manchar sua honra e como não podiam chamá-lo de mentiroso, charlatão ou bêbado, quando mesmo os seus mais ferrenhos inimigos pagãos reconheciam sua integridade moral e seu comportamento digno, restava apenas esta suposição absurda e sem fundamento: pôr em dúvida sua sanidade mental. Ainda que seja verdade que alguns dos opositores idólatras, seus contemporâneos, tenham lançado de modo leviano esta mesma acusação, quando o Profeta iniciou sua convocação ao Islam, seu sucesso em derrotá-los e sua capacidade inigualável de liderança fez com que caíssem em total descrédito diante do povo.

A biografia do Profeta está muito bem documentada por historiadores idôneos. Não há qualquer indício de qualquer traço de demência ou algo semelhante em sua vida, é absolutamente conhecido que foi um homem normal, saudável, que constituiu família e teve uma vida produtiva.

A suposição encontra muitas objeções racionais, citemos duas:

1 – A primeira delas está relacionada ao Livro Revelado ao Profeta, o Alcorão. Como explicar que um homem mentalmente doente e conhecidamente, iletrado, compusesse (ele próprio) ou fosse capaz de imaginar uma obra tão complexa na linguagem e no conteúdo como o Alcorão? A rica tradição poética e literária dos árabes foi superada por esse Livro, ou seja, os sábios, literatos, poetas e filósofos árabes não foram capazes nem antes e nem depois, de produzir qualquer obra que pudesse se comparar ao Alcorão, e então, como podemos atribuir tal obra a um iletrado?

Maurice Bucaille, pesquisador francês, ao ler o Alcorão, lançou exatamente esta pergunta escrevendo: “Como é possível um homem iletrado tornar-se o autor mais importante da literatura árabe? Como pôde ele pronunciar da natureza científica o que nenhum outro ser poderia fazê-lo naquela altura, e tudo sem um único engano?”

De fato, as verdades científicas afirmadas no Alcorão, inteiramente desconhecidas há 1.400 anos, e que só começaram a ser comprovadas no século XX, também se colocam como uma objeção racional aos que pretendem atribuir o Alcorão à Mohammad ou supor que tenha sido mero fruto de alucinações.

George Sail, tradutor do Alcorão, escreveu: “A caneta humana é impotente para escrever um livro milagroso como o Alcorão, é um milagre absoluto. Muito superior do que o milagre de ressuscitar os mortos”.

A razão aponta para algo sobre-humano. Não se conhece na história da humanidade qualquer ocorrência de um iletrado com “alucinações” que tenha produzido uma obra que tenha vencido o tempo, que contenha verdades científicas inimagináveis para sua época, que seja tão profunda e completa, que sirva de fundamento e código de vida e conduta para os indivíduos e as sociedades, que lance as bases para a política, a ética, as leis, a filosofia, a economia, os regulamentos em tempos de paz e de guerra, em todas as épocas e em todos os lugares.

2 – Também é dificil explicar como um homem sem influência ou poder político, sem instrução e sem apoio material e novamente (como dizem seus opositores) “psicologicamnetee perturbado”, enfrentar os poderosos chefes idólatras de seu povo, resistir a perseguição, pouco a pouco conquista os corações e as mentes para sua Causa. Unir inimigos históricos afundados no paganismo mais primário, convertendo-os a fé monoteísta, e com isso, pacificá-los. E, se tornando líder, general, estrategista, juiz; ser capaz de transformar as bases milenares da sociedade em que vivia e estabelecer um Estado e uma Nação, uma nova civilização?

Na realidade, a suposição é uma deliberada ofensa aos muçulmanos… uma ofensa irracional, tanto quanto supor que Moisés tenha tido “alucinações” no Monte Sinai. A questão de crer ou não na profecia de Moisés ou de Mohammad é uma questão de liberdade de consciência, mas esta é uma suposição irracional, sem qualquer base histórica comprovada, fruto apenas e tão somente da intenção de difamar a fé islâmica.

5) “Que a história do Islamismo foi toda escrita com sangue e que a expansão da fé islâmica foi conseguida pela espada.”

De fato, a história do mundo islâmico foi e tem sido escrita com sangue. Porque toda a história de todas as grandes civilizações foi escrita com sangue. Guerras, invasões e conflitos fazem parte do processo histórico de todas as nações e da própria história da humanidade. Entretanto, a pretensão de se aliar o Islam a idéia da violência se deve principalmente a seu caráter expansionista. Em geral, os historiadores cometem um erro crasso ao atribuir a expansão islâmica a uma fantasiosa “propagação da fé pela espada.” Isto, como veremos não foi verdadeiro no passado, como não tem sido na atualidade, em que o Islam continua a se expandir sem que se possa afirmar que tal expansão se deva por algum tipo de imposição. Antes de tratarmos da questão, seria interessante atentarmos a história do “expansionismo cristão”.

Se é uma verdade que todas as grandes civilizações e religiões possuem um histórico sangrento, é igualmente verdadeiro que nenhuma delas cometeu maiores atrocidades, massacres e genocídios em nome da fé do que o Cristianismo. A civilização cristã ocidental lançou-se ao mundo empunhado a espada numa mão e a cruz na outra e matou, violentou, converteu à força, e, sobretudo, saqueou por toda parte. Não apenas o fanatismo cego das cruzadas que justificou crimes inomináveis contra muçulmanos e judeus, não apenas a conquista do novo mundo na qual a aliança da espada e da cruz dizimou milhões de indígenas, ou o protestantismo que abençoou o massacre e o saque na América do Norte até que tudo fosse tomado das nações indígenas, suas terras, suas famílias e suas vidas; os quatro séculos de escravidão dos africanos a pretexto de conduzi-los a salvação, enquanto as grandes nações européias partilhavam e surrupiavam as riquezas do continente negro…

A fé cristã sim, foi imposta à força pelos europeus, e todo derramamento de sangue perpetrado teve a chancela da “salvação oferecida aos povos.” Este é um fato histórico indiscutível. É espantoso que então o Papa Bento XVI de modo tão despropositado se sinta no direito de reproduzir a opinião de um fanático medieval, e atribua ao Profeta do Islam a idéia de “guerra santa”, da conversão pela espada, idéia originalmente fabricada pela Igreja. Custa-me acreditar que semelhante prova de ignorância histórica seja dada por um Papa, cujos seguidores o têm na conta de um intelectual e destacado pensador da teologia cristã!

Recentemente, quando de sua visita ao Brasil, Bento XVI deu outra estranha declaração, na qual não reconhecia a culpa da Igreja na criminosa colonização da América. Dias depois, diante das críticas de líderes indígenas, voltou atrás. Ao que parece seus preconceitos e sua crença na superioridade da civilização cristã ocidental, o impedem de ter a humildade de reconhecer os grandes erros históricos da Igreja.

O expansionismo islâmico, e os historiadores modernos em sua maioria concordam, não se operou através dessa crença da “conversão pela espada” pois o próprio texto alcorânico a invalida. Diz o Livro Sagrado:

“NÃO HÁ IMPOSIÇÃO QUANTO A RELIGIÃO, POIS JÁ SE DESTACOU A VERDADE DO ERRO.” (Alcorão s.2 v. 256)

A imposição, na perspectiva do Islam, é incompatível com a religião, pois esta, depende da fé e da vontade livremente exercida. Vejamos o que alguns pesquisadores ocidentais (e não-muçulmanos) dizem sobre o assunto:

O Inglés Lacy O’Leary afirma:

“A história esclareceu, que a lenda dos muçulmanos fanáticos arrastando o mundo e forçando o Islam à ponta da espada sobre os povos conquistados é um dos mais fanáticos e absurdos mitos que os historiadores constantemente mencionam.”

A revista “Seleções” de maio de 1955, publica um artigo de James Michaner, em que ele diz:

“Não há outra religião na história que se expandiu tão rapidamente como o Islam, o ocidente pensou que esta onda religiosa foi possível através da espada, mas nenhum sábio moderno aceita essa idéia. O Alcorão é explícito no apoio à liberdade de consciência.”

O Esforço para o Diálogo entre Oriente e Ocidente

Os inimigos do Islam apostam na desinformação e na ignorância, pois sabem que qualquer pessoa razoavelmente inteligente, se tiver acesso a informações corretas fará um bom conceito do Islam. Com o surgimento da Internet, tornou-se possível uma veiculação mais equilibrada da informação. Com um grande número de sites islâmicos no mundo, o ocidente começa então a conhecer melhor o Islam, a cultura islâmica e os muçulmanos. Esta nova realidade surge num momento especialmente crítico. Duas visões fundamentalistas de mundo se digladiam: O fanatismo da hegemonia americana, baseado numa concepção distorcida do cristianismo, movido e sustentado por seitas evangélicas (à serviço do sionismo) contra o integrismo muçulmano, baseado em interpretações errôneas do Islam. Mais do que nunca o diálogo entre Ocidente e Oriente se faz necessário.

Este diálogo não será possível se ambos não reconhecerem valores mútuos, não abandonarem posições inflexíveis em nome do que é justo e humano, se não se respeitarem mutuamente. O esforço para este diálogo parte do conhecimento e do respeito, Inx’allah (Deus queira), este trabalho possa contribuir para isso.

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