A Arresala, Centro Islâmico do Brasil, tem cumprido um importante papel na divulgação do Islã no país e na América Latina. Meu contato mais próximo com a organização ocorreu durante a pandemia, em 2021, quando fui convidada para participar do ciclo de lives “Xiismo e Xiita: radical ou pacífico?” para tratar do tema “A imigração árabe e muçulmana no Brasil e a Xenofobia”. Infelizmente foram os acontecimentos na Palestina deflagrados em 7 de outubro de 2023 que nos aproximaram novamente. Já nos primeiros momentos, a Arresala lançou uma série de debates virtuais sobre o tema da “Questão da Palestina” do qual participei tratando da história do conflito e, mais adiante, sobre os termos semita e antissemitismo. Assim, o papel da Arresala, além de divulgar, é de esclarecer sobre questões que tratam do Islamismo e dessa comunidade no Brasil e no mundo.
Com 25 anos de história e atuação, o evento “Islã, a religião do Diálogo e da Vida”, ocorrido em 24 de abril de 2024, além de celebrar a efeméride, realizou o Encontro Islâmico no Brasil. O que chamou a minha atenção foi a presença de muçulmanos de vários países da América Latina, como Argentina, Colômbia e Venezuela, a comitiva do Irã, lideranças religiosas e demais autoridades que atenderam ao encontro.
Com a proposta do diálogo inter-religioso, a presença do representante da CNBB cumpriu a proposta de construir pontes entre as comunidades religiosas no Brasil que, independentemente do credo, partilham da crença em um único Deus, da defesa da vida e de nossa humanidade como expressão divina. Foi esse ponto fundamental das falas do Iman Al-Khazraji, do Centro Islâmico do Brasil, e do Aiatolá Ramezani da Assembleia Mundial Ahlul Bait (A.S.).
O papel das mulheres, outro ponto fundamental e destacado no evento, foi além das palavras. As mulheres que estiveram presentes ao evento, como palestrantes ou espectadoras, como integrantes de famílias participantes demonstraram que as muçulmanas, tal qual outras mulheres, podem ocupar diferente e múltiplos espaços. Estavam lá crianças, jovens, adultas; estudantes, médicas, professoras; mães, esposas, filhas, irmãs. Nenhuma dessas características são excludentes e os papeis dessas mulheres são múltiplos como em qualquer sociedade e religião. Mas gostaria de destacar uma observação que rompe as visões preconceituosas e preconcebidas sobre homens muçulmanos opressivos: vi muitos homens que cuidavam das crianças, enquanto as mães se concentravam nas palestras ou em outra atividade, que compartilharam o mesmo espaço no local do evento, no lobby, no auditório, no almoço.
A justiça social, o combate ao racismo, à intolerância e ao preconceito foi um tema importante também discutido pelas lideranças religiosas. Destaco a lembrança a Bilal, o escravo negro da Abíssinia, um dos primeiros a aceitar o Islamismo, e o combate à ideia de superioridade de classe e social dos coraixitas, tribo proeminente na Arábia antes do Islã, como um exemplo de que devemos promover a igualdade e a justiça social.
Finalmente, a questão do Meio Ambiente foi um tema essencial, atual e fundamental das apresentações, já que estamos na maior crise ambiental e climática que o homem já viveu e que, por seu impacto, tem sido identificada como o início de uma nova era, o Antropoceno. Destaco dois pontos das falas que aproximam a questão ambiental do diálogo religioso e da ética em relação ao inimigo: jamais contaminar a água do inimigo, jamais cortar suas árvores. Preservar a vida é a mensagem central por trás dessas palavras.
Para finalizar, parabenizo a organização do evento, as palestras, as traduções simultâneas (português, árabe, persa), o ambiente agradável, o diálogo e a convivência como pontos centrais do encontro. Agradeço o convite e a oportunidade de ter compartilhado desse momento importante para a comunidade islâmica do Brasil e da América Latina, como mulher, muçulmana e historiadora.
Profa. Dra Samira Adel Osman
São Paulo, 30 de abril de 2024.