Suas palavras de sabedoria

O texto que segue é somente uma parte de uma longa narrativa e de muitas perguntas que um monge, chamado Shimon Bin Lawi bin Yahuda, tinha feito ao Profeta (S.A.A.S.) que, apesar de seu grande número respondeu a todas. Em razão disso, o monge acreditou na veracidade das respostas e no Profeta (S.A.A.S.). Aqui, citamos algumas dessas questões.

O monge perguntou: Fala-me sobre o intelecto. O que é e como é, o que se origina e o que não se origina dele. Descreva todas as suas partes em detalhes.

O Profeta (S.A.A.S.) disse: O intelecto é uma barreira à ignorância. A alma se assemelha ao mais malicioso dos animais. Certamente cará confusa se não for controlada. O intelecto é uma barreira à ignorância. Quando Allah o criou, disse-lhe: “Aproxima-te”. O intelecto se aproximou e Allah disse: “Afasta-te”. O intelecto então se afastou. Em seguida, Allah, o Abençoado, o Sublime, disse: “Por Minha Glória e Sublimidade Eu juro, jamais criei algo que seja maior e mais obediente do que tu. Por ti, Eu iniciarei e repetirei. A recompensa será para ti e a punição recairá sobre ti”.

A clemência foi rami cada a partir do intelecto. O conhecimento se ramificou da clemência. A razão se ramificou do conhecimento. A castidade se ramificou da razão. O auto-respeito se ramificou da castidade. O pudor se ramificou do auto-respeito. A serenidade se ramificou do auto-respeito. A persistência na boa vontade se ramificou da serenidade. A antipatia ao mal se ramificou da persistência na boa vontade. A disposição para ouvir os conselhos se ramificou da antipatia ao mal. Foram essas as dez categorias do bem. Cada uma delas possui dez tipos.

Os ramos da clemência que se originam do intelecto são: a admissão do que é bom, a ligação com os piedosos, a elevação com respeito a humilhação e a mesquinhez, o estímulo ao bem, a proximidade com os graus de nobreza, do perdão, da pausa, da bondade e do silêncio.

Os ramos do conhecimento são: a riqueza a despeito da pobreza, a generosidade não obstante a mesquinhez, a dignidade apesar da fraqueza, segurança não obstante a enfermidade, proximidade apesar da distância, timidez a despeito da vanglória, elevação apesar da humildade, honra a despeito da humilhação, sabedoria e prestígio. Esses são os ramos do conhecimento que se originam do intelecto. Abençoados são os que possuem raciocínio e sabedoria.

Os ramos da razão são: retidão, orientação, piedade, temor, efetividade, temperança, equilíbrio, generosidade e conhecimento da religião de Allah. Os inteligentes os adquirem por intermédio da razão. Abençoados os que aderem à razão por seus caminhos.

Os ramos da castidade são: o contentamento, a modéstia, a abundância, o conforto, a consideração, a reverência, a recordação, a ponderação, a generosidade e a liberalidade. Os inteligentes os adquirem pela castidade, uma vez que estão satisfeitos com Allah e com o que lhes foi destinado.

Os ramos do auto-respeito são: a benevolência, a modéstia, a piedade, o recorrer a Allah, o entendimento, as boas maneiras, a caridade, a amabilidade, a virtude e a cortesia. Os inteligentes os adquirem pelo auto-respeito. Abençoados são os que Allah agraciou com o auto-respeito.

Os ramos do pudor são: a tolerância, a bondade, a consideração a Allah secreta e abertamente, a segurança, a abstenção do mal, o semblante feliz, a clemência, a vitória e a boa reputação. Os inteligentes os adquirem pelo pudor. Abençoados são os que acatam o conselho de Allah e temem Seu escândalo.

Os ramos da serenidade são: a gentileza, a constância, o cumprimento dos acordos, o abandono da deslealdade, a veracidade no falar, a castidade, o ganho lícito dos bens, a prontidão diante do inimigo, a proibição do mal e o afastamento da tolice. Os inteligentes os adquirem pela serenidade. Abençoados os que são sérios, que não demonstram leviandade nem ignorância, que perdoam e esquecem as ofensas.

Os ramos da perseverança na boa vontade são: a abstenção da luxúria, o afastamento do atrevimento, a abstenção das coisas más, a convicção, o amor pela salvação, a obediência ao Beneficente, a glorificação da prova, o afastamento de Satã, o atendimento à justiça, e a declaração do que é direito. Os inteligentes os adquirem pela perseverança na boa vontade. Abençoados são os que mencionam continuamente o Além e a ressurreição, e que aprendem com a morte.

Os ramos da antipatia pelo mal são: a compostura, a paciência, a vitória, a retidão no curso, a persistência na razão, a crença em Allah, a observância dos assuntos da religião, a sinceridade, o abandono dos assuntos sem importância e a dedicação aos assuntos úteis. Os inteligentes os adquirem mediante a antipatia em relação ao mal. Abençoados são aqueles que estabelecem o direito de Allah e se firmam em Sua senda.

Os ramos da disposição para ouvir os conselhos são: o aprimoramento da razão, a perfeição do intelecto, os bons resultados, a salvação em relação à mesquinhez, a aprovação, a cordialidade, a tranquilidade, a correção, o progresso nos assuntos e a aptidão para obedecer a Allah. Abençoados são os que se salvam das armadilhas dos desejos.

Esses são os ramos do intelecto.

Shimon disse: Informa-me sobre os sinais do ignorante.

O Profeta (S.A.A.S.) respondeu: O ignorante é aquele que te prejudica quando tu o acompanhas, ofende-te se o deixares, compromete com seus favores se tiver te dado alguma coisa e mostra ingratidão se tiver recebido alguma coisa; é desleal se acaso contares algum segredo a ele, e te acusa de ter divulgado seu segredo se te contar algum. Torna-se ingrato, grosseiro e rude se ca rico, se for pobre nega abertamente as graças de Allah, se excede se estiver feliz, se desespera se ca triste, gargalha quando ri e cai em depressão quando chora. O ignorante ofende os piedosos. Nem ama tampouco respeita Allah. Não se envergonha de Allah e nem se recorda Dele. Ele te elogiará excessivamente se agradá-lo, do contrário, cessará o elogio e te acusarás de defeitos que não tens. Esse é o modo de se comportar do ignorante.

Shimon perguntou: E quanto aos sinais do Islam?

O Profeta (S.A.A.S.) respondeu: Os sinais do Islam são a fé, o conhecimento e a obra.

Shimon perguntou: E os sinais da fé, do conhecimento e da obra?

O Profeta (S.A.A.S.) respondeu: Os sinais da fé são quatro: a declaração da unicidade de Allah, a crença Nele, a crença em Seus Livros e a crença em Seus mensageiros. Os sinais do conhecimento são quatro: o conhecimento de Allah, o conhecimento de Seus discípulos, o conhecimento dos deveres e a observância dos mesmos. Os sinais da obra são: a prece, o jejum, o zakat (caridade) e a sinceridade.

Shimon perguntou: E quanto aos sinais do honesto, do crente fiel, do paciente, do arrependido, do grato, do submisso, do virtuoso, do conselheiro, do convicto, do sincero, do abstinente, do piedoso, do temente a Allah, do falso crente, do injusto, do ostentador, do hipócrita, do invejoso, do esbanjador, do inadvertido, do indolente, do mentiroso, do pecaminoso e do traidor?

O Profeta (S.A.A.S.) disse: Os sinais do honesto são quatro: fidelidade, crença na promessa e na ameaça de Allah, cumprimento do que tenha acordado e o afastamento no que diz respeito a fraude. Os sinais do crente (fiel) são: a bondade, a compreensão e a timidez. Os sinais do paciente são quatro: resiliência nos infortúnios, determinação nas boas ações, modéstia e clemência. Os sinais do arrependido são quatro: o aconselhamento por Allah, o abandono do erro, a aderência ao correto e a dedicação à caridade. Os sinais do grato são quatro: demonstra gratidão pelas graças, resistência diante dos infortúnios, satisfação com os decretos de Allah, glorificação e louvor somente a Allah. Os sinais do submisso são quatro: atenta para Allah estando a sós ou em público, escolhe o que é bom, medita sobre o Dia da Ressurreição e confia em Allah.

Os sinais do virtuoso são quatro: purifica o coração, aprimora as boas ações, incrementa os ganhos e aperfeiçoa todos os assuntos. Os sinais do conselheiro são quatro: julga corretamente, se submete ao que é certo, deseja para os outros tudo o que deseja para si mesmo, nunca oprime ninguém. Os sinais do convicto são seis: crê em Allah assim que adquire certeza sobre Sua existência, adota a precaução quanto à morte assim que adquire a certeza sobre sua realidade, teme o escândalo (de Allah) quando se torna convicto sobre o Dia da Ressurreição. Almeja o Paraíso quando se certifica do inevitável, se esforça arduamente para se afastar do Inferno quando adquire a certeza sobre sua existência, e ajusta contas com si mesmo quando adquire a certeza do Julgamento Final.

Os sinais do sincero são quatro: seu coração é equilibrado, seus órgãos são equilibrados, demonstra bondade com generosidade e se refreia de prejudicar os outros. Os sinais do abstinente são dez: se abstém das coisas proibidas, faz com que todos estejam a salvo do mal (que possa cometer), cumpre os deveres para com Seu Senhor, obedece apropriadamente se é um servo, administra apropriadamente se é um senhor, não demonstra fanatismo nem malícia, trata com bondade aqueles que o maltratam, beneficia aqueles que o prejudicam, perdoa os que são injustos com ele e se comporta com modéstia pelo direito de Allah. Os sinais do piedoso são dez: ama, odeia, se associa, se separa, se irrita, se agrada, age, aconselha e se submete, tudo por Allah. É sempre receoso, temeroso, puro, fiel, sensível, cuidadoso e, por m, caritativo por Allah. Os sinais do temente a Allah são seis: teme a Allah e se preocupa com Sua reprovação; começa e termina seu dia como se visse Allah diante dele; não está interessado nos prazeres mundanos e não se preocupa senão com as elevadas características.

Os sinais do falso crente são quatro: se intromete em assuntos que não lhes dizem respeito, entra em conflito com aqueles que são superiores a ele, busca aquilo que não pode conseguir, se dedica a assuntos que não o beneficiam. Os sinais do injusto são quatro: emprega atos de desobediência a Allah para prejudicar os que ocupam posições mais altas, emprega os recursos que conta para controlar os que ocupam posições inferiores, odeia o que é correto e amplia a injustiça ou presta apoio aos injustos. Os sinais do ostentador são quatro: demonstra empenho no ‘ibad (culto) se alguém o observa e se torna indolente quando está a sós, busca o elogio alheio em tudo o que faz, e usa a negação em toda matéria unânime para se distinguir. Os sinais do hipócrita são quatro: sua realidade é corrompida, sua língua contraria seu coração, sua palavra contraria sua ação; seu interior contraria seu exterior. Ai do hipócrita, pois sofrerá indefinidamente no fogo do Inferno. Os sinais do invejoso são quatro: calúnia, adulação e satisfação com o infortúnio alheio.7 Os sinais do esbanjador são quatro: se vangloria por coisas sem nenhum valor, consome aquilo que não possui, não presta favores e nega tudo o que não o beneficia. Os sinais do inadvertido são quatro: irreflexão, desatenção, negligência e esquecimento. Os sinais do indolente são quatro: relaxa até descuidar, descuida até perder, perde até se enfadar, se enfada até cometer pecados. Os sinais do mentiroso são quatro: nem diz a verdade nem confia nos outros; semeia discórdia entre as pessoas e calunia. Os sinais do pecaminoso são quatro: negligência, tolice, hostilidade e difamação. Os sinais do traidor são quatro: comete atos de desobediência ao Beneficente, incomoda os vizinhos, odeia os camaradas e se aproxima dos tiranos.

Shimon disse: Em verdade, curaste e abriste meus olhos. Por favor, guia-me para os caminhos em que eu possa ser orientado.

O Profeta (S.A.A.S.) ensinou: Tens inimigos, humanos e gênios, que te perseguem e lutam contigo para arrebatar a tua religião. Os inimigos humanos são aqueles que no mundo vindouro serão insignificantes e que não almejam as dádivas de Allah. Sua única preocupação é criticar. Não criticam a si mesmos tampouco atentam para suas más ações. Se observam um homem virtuoso o invejam e o acusam de ostentação. Se for um dissoluto, não o fazem. Os inimigos gênios são Iblis (Satã) e seu partido. Se ele vier e disser a ti (por inspiração maligna) que teu filho morreu (com a intenção de fazê-lo desesperar e demonstrar insatisfação com Allah), dize: “Os vivos são criados para morrer. É meu prazer que uma parte de mim esteja no Paraíso”. Se ele vier a ti e disser que tua fortuna foi perdida, dize: “Louvado seja Allah que deu e tirou, e isentou-me do pagamento do Zakat”. Se vier a ti e disser que as pessoas estão te maltratando enquanto tu as trata com bondade, dize: “No Dia da Ressurreição a reclamação recairá sobre os que prejudicam os outros. Os bondosos não serão interrogados por isso”. Se vier e demonstrar admiração por tua caridade, a fim de provocar em ti orgulho por tuas boas ações, dize: “Minhas más ações são mais numerosas do que as boas”. Se vier e demonstrar admiração por tuas orações, dize: “Minha falta de zelo nos deveres para com Allah supera minhas preces”. Se vier e demonstrar admiração por tuas doações, dize: “Eu recebo mais do que dou”. Se vier e disser que existem muitos que são injustos contigo, dize: “Eu fui injusto com um número maior de pessoas”. Se vier e demonstrar admiração por tuas ações, dize: “Eu desobedeci em muitas situações”.

Se vier e recomendar a ti que consumas bebida inebriante, dize: “Eu não cometo transgressões”. Se vier e pedir que tu ames os prazeres deste mundo, dize: “Eu não os amo, uma vez que iludiram muitos outros”. Ó Shimon, associa-te com os piedosos e siga os profetas Jacó, José e Davi. Quando Allah, o Abençoado, o Altíssimo, criou o mundo inferior, este se orgulhou, exultou e disse: “Nada me superará”. Então, Allah criou a terra para que casse sobre o seu dorso; e o mundo inferior se submeteu. A terra se encheu de orgulho e disse: “Nada me superará”. Com isso, Allah criou as montanhas e as fixou no dorso da terra para que não oscilasse. Assim, a terra se submeteu e se assentou. As montanhas, então, ficaram orgulhosas. Se elevaram e disseram: “Nada nos superará”. Allah criou o ferro para cortar as montanhas. Assim, elas se submeteram. O ferro disse cheio de soberba: “Nada me superará”. Por isso, Allah criou o fogo para derreter o ferro. O fogo arquejou e disse com orgulho: “Nada me superará”. Portanto, Allah criou a água para extinguir o fogo. A água, então, disse cheia de orgulho: “Nada me superará”. Allah criou o vento que moveu as ondas e fez surgir o que jazia em suas profundezas, criando uma barreira que interrompeu o fluxo da água. Esta se submeteu e o vento soprou e disse: “Nada me superará”. Então, Allah criou o homem para que construísse barreiras ao vento. E este, se submeteu. O homem, por sua vez, excedeu os limites e disse de modo tirânico: “Coisa alguma é mais poderosa do que eu”. Assim, Allah criou a morte, e o homem se submeteu. Então a morte se encheu de orgulho, porém, Allah o Onipotente disse, “Nunca te orgulhes. Eu te extinguirei entre os dois grupos, o do povo do Paraíso e o do povo do Inferno, e Eu não te ressuscitarei em tempo algum”. Ao ouvir isso a morte ficou amedrontada.

O Profeta (S.A.A.S.) então disse: “A clemência supera a ira, a misericórdia supera a insatisfação e a caridade supera o pecado”.


7 Ao que parece, o quarto sinal do invejoso foi apagado no texto original ou que a palavra “quatro” foi um erro, sendo que o correto seria “três”. Em sua recomendação ao lho, Luqman diz: “Os sinais do invejoso são três: a difamação do ausente, a adulação do presente e a demonstração de satisfação com o infortúnio alheio”.

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